quinta-feira, 18 de junho de 2009

Casório de uma singela

O sol despontava quente na manhã de 23/05/2008. Madalena acordou com o canto do galo da sua vizinha e futura madrinha, Ana Jacó. Aninha, como era conhecida nas redondezas do bairro pobretão Pintolhas do Agreste, tinha severos cuidados com o galo Pimpão, tanto que ele não falhava em um só segundo. Seis e meia com mais trinta e cinco segundos, era sagrado, o galo se estrebuchava tanto mantendo suas asas abertas, que certas vezes chegava até mesmo a tossir. Bom. Madalena não se viu ainda no espelho, pois queria o banho tomar. Desceu as escadas de vidro fosco e foi se banhar na bacia posta de lado na porta dos fundos da casa. Ninguém a via se despindo, era muito cedo e a vizinhança não tinha o costume de se render aos agouros do velho Pimpão. Nem mesmo Madalena tinha este costume.
Passou cuidadosamente o sabão pelo corpo, centímetro por centímetro ‘Uribaldo vai ficar porreta quando me cheirar, ah vai!’ – dizia sozinha e passava novamente o sabonete por onde já havia se lavado. Ficou assim se repetindo a lavagem corporal por mais meia hora. Chegou ela até mesmo “pescar” com a bucha de banho na mão direita. Acordou num supetão tremendo que jorrou água por toda a saleta transformada em banheiro de luxo.
Subiu as escadas novamente e desta vez, já cheirosa e corada, foi ao espelho. Estacionou os olhos e sorriu. Era o dia. ‘Sim. Este é o meu dia. Ah danada... Tu finalmente conseguiste! O teu homem lá te espera... Aos pés do Divino para te dizer o SIM! Alarga este sorriso menina – dizia para si frente ao espelho – e te arruma feito a mais bela das princesas! Aiai’. A campainha tocou, era sua mãe.
– Vamos! Estamos atrasadas mamãe!
– Calma minha filha... Ainda é muito cedo!
– Eu sei, mas não quero deixar de me preparar em nenhum pedacinho só que seja! Uribaldo me espera toda linda lá no altar do Divino!
– Onde tu foste encontrar tamanho nome de homem? Eu ainda me pergunto. Que nome mais estranho... Somente você poderia realizar tal feito, Madalena, minha filha.
–Mãe! – chamou a atenção da velha – estamos atrasadas e a senhora aí falando sem parar. Vamos!
Lá pelas tantas da tarde, por volta de 18h30, estava tudo pronto. Madalena veio vindo pela escada e seu batom vermelho despontou através da brancura da parede. Havia ali embaixo na sala mais umas dez mulheres. Eram as primas, tias, amigas e vizinhas, além da madrinha Ana Jacó. Desfilou como se estivesse a caminho do altar. Assim que chegou à porta de saída deu uma última olhada para sua casa de solteira. Sua futura casa já estava pronta nos fundos da casa de sua sogra, dona Serafa, no bairro do Pontão Alto. Entrou no fusca 82 emprestado do tio-avô e dirigido pelo seu primo, Roberto, que estava todo emperequetado em trajes de motorista executivo e até mereceu elogios feito pela noiva.
Já à porta da igrejinha todos ansiavam a chegada da noiva. Uribaldo não se continha de emoção. A banda começou a tocar a marcha da noiva enquanto todos se levantaram. Ela foi entrando em passos firmes, mas seu pai não a carregava, pelo contrário, ele enlouquecia, ‘minha filhinha! Não!’ Seu Nestor deitou-se à beira da igreja do lado de fora e colocou um cinzeiro de lado, acendeu um cigarro e gritou.
A música parou. Uribaldo tentou ver o que era o barulho e correu em direção à porta principal com medo de que sua amada estivesse passando mal. Quando pôs os pés do lado de fora não acreditou no que viu. Madalena estava deitada ao lado do cinzeiro com os lábios colados. Ela observava o céu e dizia: ‘viemos todos de lá, não é papai?’ ‘sim minha filha, sim minha filha’ ‘e porque o senhor não me disse antes?’ ‘não sei, apenas me deixaram claro hoje de que você partirá amanhã, a lua de marte é linda vista de seu satélite principal’ ‘não faça isto hoje’ ‘é... sei não’.
Uribaldo ficou parado perto de sua ex-amada terráquea. O fotógrafo apenas conseguiu focar os seus pés e sua tosca caminhada. Ela era ainda mais linda e sua cabeça estava ainda mais á beira da loucura.